Lamentação aos pés da Virgem
A doce melodia
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Ergo-me, então:
A alma amarrotada pelo peso de meus crimes,
o antigo torpor a lavrar ainda
no corpo entumecido.
Apenas teu olhar me atingiu, Virgem amável,
o rubor cobriu-me a face,
a cabeça pendeu-me para o chão.
Meus olhos nada mais viram, as lágrimas não jorravam:
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As pálpebras apertadas seguravam os olhos cheios.
À tua vista, ó Imaculada,
fugiram-me dos lábios as palavras:
o medo enregelou-me a língua entorpecida.
A mente estremecia, cônscia de sua torpeza:
meus crimes numerosos fulminaram-me.
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Os ouvidos somente
sorviam as tuas divinas palavras,
ansiosos de aprender em teus lábios
uma expressão de carinho.
E eis que de teus lábios,
se não me enganou louca ilusão,
destacou-se uma voz que eu conhecia:
"Ergue-te, vem comigo
para o templo do Onipotente,
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tu aqui meu servo serás perpetuamente!"
Ouvi, e me voltou a vida,
e a língua me soltou e exclamei:
"Eia, Virgem bendita, sigo-te daqui por diante
por onde quer que fores!"
A morte, o ódio eterno,
a repulsa da divina face, a pena que não morre,
eis aí o que meus crimes mereciam.
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Mas, se ao indigno restituis com a vida
o teu doce amor,
esta será para mim a melhor glória
de teu carinho de mãe!"
Assim falei: vi-te sorrir ao meu pedido
favoravelmente...
nova esperança penetrou-me a alma.
Apossou-se de meu coração a santa audácia
de imitar tua vida,
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de te seguir por toda a parte e por toda a vida,
de longe ao menos!